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segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Conto de Inverno VIII



A panela quente exala um cheiro doce de açúcar, no seu interior, uma barra de chocolate funde-se ao leite condensado. Uma mulher de longos cabelos negros e um sorriso malicioso no rosto mexe o tacho enquanto canta uma música fúnebre. No lado de fora do antigo casebre, nevava.
Poderia facilmente dizer que estou falando de uma das histórias clássicas do mundo, ‘João e Maria’, onde as crianças encontram ma casa toda feita de doce. Mas não era bem essa história, esse foi um jeito simples de dizer que eu estava fazendo brigadeiro no chalé dos meus pais.
Minha empreitada deu-se porque, papai e mamãe haviam saído para comprar comida na feira, a dispensa já estava vazia. Me deixaram em casa pois recusei levantar da cama as cinco da matina enquanto lá fora fazia 5°C e debaixo do meu cobertor fazia uns 18°C. Não tenho culpa. Mas a verdade é que, por causa da neve, eles ainda não retornaram, e eu fiquei com fome. Encontrei uma lata de leite condensado perdida, e algumas barrinhas de chocolate no pote de doces, era o suficiente para acalmar o meu estômago.
Com o brigadeiro no prato, fui aninhar-me no parapeito da janela para observar a neve cair. Aquele momento me fizera lembrar um tempo, de uma pessoa que amara muito, e que só de lembrar daqueles olhos verdes já sentia o coração aquecer. O vento seco do inverno suavemente soprou meu rosto, fechei os olhos, era como se ele me acariciasse de novo. Fitava novamente o branco simbolista, que cobria feito açúcar a paisagem. Ao longo da estrada vi um homem de cabelos louros olhando para mim. Senti o corpo gelar, o coração acelerar, ele sorria para mim. Coloquei o brigadeiro no sofá e calcei as botas para neve, abri a porta depressa e pulei o portão, corri o mais rápido que pude para finalmente poder encontrar-me nos braços daquele homem.
Ninguém. Não havia ninguém. Ao chegar na encruzilhada, aonde o tinha avistado, ele não estava lá. Então tudo aquilo fora uma peça da minha mente, o constante vapor d’água condensado saía da minha boca enquanto meus pulmões permaneciam em brasa, olhava para todos os lados incrédula. Era ele, eu sei. Parecia tão real. Os olhos encheram-se de lágrima, senti uma profunda aflição, mas não chorei. Sabia que ele não iria gostar de me ver chorando, sempre acreditou que eu era forte. Queria saber onde ele estava.
Conformada com esse delírio, voltei com um lento caminhar para casa, abri o portão e olhei para a porta, meu cachorro me esperava quieto, como se compreendesse minha dor. Ao chegar na varanda ainda olhei para trás, queria ter certeza que era uma ilusão, e era. Entrei em casa e me dei conta do brigadeiro. Já era, meu cachorro havia comido tudo, por isso que ele estava quieto. Suspirei e fui lavar a louça.
Lentamente, de tas de uma árvore sai um homem. Este derramava singelas lágrimas dos olhos verdes. Olhou o chalé ao longo da encruzilhada, passou os dedos calejados pelos fios louros que lhe cobriam a cabeça, um sorriso lhe preencheu o rosto sofrido, “Ela não chorou”, disse, e tomou o caminho para sair da cidade.

Gabriela Vaz

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